quarta-feira, 16 de abril de 2008

O RENASCIMENTO

Introdução

É muito difícil conceituar um movimento histórico tão criativo e de amplas dimensões no tempo e no espaço como foi o Renascimento. Na verdade, não existiu um Renascimento, mas muitas experiências renascentistas que se manifestaram de diferentes formas nesse período. Os novos valores renascentistas atingiriam todas as áreas do conhecimento huma­no, em quase toda a Europa.

Os renascentistas gostavam de perceber o Renascimento como um momento de brusca ruptura que se opunha à Idade Média. Na realidade, o universo medieval era tratado por eles como um tempo obscuro cheio de irracionalidade e ignorância (a denominada Idade das Trevas). A visão de mundo que começava a alcançar muita presença no século XV tentava se opor ao mundo medieval, procurando retomar os princípios greco-romanos para fazer renascer a razão, o conhecimento e as artes.

Contudo, o Renascimento começou a se configurar, lentamente, na Baixa Idade Mé­dia, junto com a ampliação das atividades co­merciais e urbanas. A partir do século XV, com a expansão marítima, o reforço dos Es­tados nacionais, a constituição das bases das línguas nacionais, o fortalecimento da bur­guesia, enfim, com o desenvolvimento do capitalismo, os novos valores humanistas e renascentistas consolidaram-se e propagaram-se rapidamente.

Nesse momento começava a surgir um homem (o burguês) com uma visão de mun­do e de natureza bem diferente da do me­dieval, o que seria muito importante para questionar e superar o universo da Idade Média.

As origens do humanismo

As transformações gerais que ocorriam na Europa medieval tornavam cada vez mais necessária a atualização e dinamização do conhecimento. A partir desse movimento introduziu-se na formação educacional os "estudos humanos" (história, filosofia, re­tórica, matemática e poesia), que procura­vam dar condições para o progresso e desenvolvimento humano. Os humanistas eram, então, as pessoas empenhadas na di­vulgação desses "estudos humanos". Nesse fato aparentemente simples existem dois elementos muito importantes para o desen­volvimento do humanismo:

para se aprofundar nas disciplinas humanísticas era necessário retomar os au­tores, as temáticas e alguns princípios da Antiguidade Clássica, de modo geral es­quecidos durante a Idade Média;

os "estudos humanos", como o próprio nome já salienta, procurava centralizar e basear suas questões e análises no mundo concreto dos seres humanos e na realida­de natural e social que os cercam; assim, as explicações sobre os seres humanos e a natureza deixavam de se basear em Deus, nos aspectos divinos e nos dogmas católi­cos, sem, entretanto, acarretar um rom­pimento definitivo com a religião católica, que continuava sendo hegemônica.

Por isso, costuma-se caracterizar o hu­manismo como um movimento antropocêntrico que glorificava o homem e a natureza humana (antropo = homem/ser huma­no; cêntrico = centro; ou seja, o homem e as coisas humanas são as medidas e o cen­tro do universo), contrastando com o teocentrismo dominante na Idade Média, fundado no divino e no sobrenatural.

Essa nova forma de encarar os homens e a natureza implicou um conjunto de no­vos questionamentos e investigações, que por sua vez foram fundamentais para o de­senvolvimento do comércio, das navega­ções, das novas invenções, da ciência, etc.

O movimento renascentista teve início na Itália devido, sobretudo, ao papel estratégico das cidades italianas no período da baixa idade média, e durante o renascimento comercial e urbano. Tais cidades articulavam as atividades comerciais com o Oriente, através do Mediterrâneo, e com o norte da Europa. As cidades portuá­rias que mais se destacavam eram Veneza, Nápoles e Génova; no interior predomi­navam Florença, Milão, Pisa, Turim, etc.

Durante esse período a Itália ainda não existia como nação unificada (isso só ocorreria no século XIX). Ela estava di­vidida em diversas cidades independen­tes que realizavam várias atividades mercantis de acordo com seus inte­resses específicos. A luta entre essas cidades pelo monopólio comercial ge­rou uma série de conflitos militares. Como não havia um exército unifi­cado, a burguesia comercial manti­nha suas cidades protegidas por exércitos mercenários, comandados pelos condottieri (chefes de tropas).

Aproveitando o período de instabilida­de política, muitas famílias burguesas, e às vezes os próprios condottieri, articulavam gol­pes contra quem estivesse no poder: a as­censão das famílias Medici, em Florença, e Sforza, em Milão, são bons exemplos. Foi nesse clima político que Nicolau Maquiavel (1469-1527) escreveu O príncipe, um livro que trata das estratégias para conquistar e/ou manter o poder, que acabou se tornando um clássico da ciência política moderna.

Algumas dessas prósperas famílias bur­guesas mantinham e financiavam artistas, cientistas e homens de letras, em busca de reconhecimento, distinção e poder. A aris­tocracia italiana e a Igreja Católica segui­ram esse exemplo. Tais protetores e financiadores ficaram conhecidos como mecenas. Tradicionalmente, costuma-se dividir o Renascimento italiano em três fases: Trecento (século XIV), Quattrocento (século XV) e Cinquecento (século XVI).

TrecentoTambém chamado por al­guns de Pré-Renascimento. Este período reflete um momento de transição, em que conviveram elementos tradicionais da cultura medieval com os princípios humanistas renovadores. Na literatura italiana, Dante Alighieri, Petrarca e Boccaccio representam bem esse período transitório; na pintura destaca-se Giotto(1266-1337), considerado um precursor do Renascimento nas artes plásticas.

QuattrocentoPeríodo de apogeu do Renascimento. Destaca-se nesse momen­to uma rica família de banqueiros, os Medícis, que assumiram o poder em Flo­rença (1434). Coincidindo com o perío­do de maior riqueza e poder político da cidade, os valores e as obras renascentistas desenvolvem-se rapidamente, sempre com apoio dos Médicis. Lourenço de Medici, por exemplo, criou a Academia Platônica de Florença. No final do século XVI uma revolta ti­rou os Médicis do poder, substituin­do-os pelo frade Savonarola, que imprimiu características mais autori­tárias à administração da cidade. Opondo-se aos ideais e à produção intelectual renascentistas, que marginalizavam as ex­plicações divinas do ser humano e do mundo, Savonarola, com apoio da po­pulação, mandou quebrar e queimar qua­dros, livros e esculturas. Suas críticas também se dirigiam à Igreja Católica, antecipando a Reforma Protestante, e por isso foi excomungado. A partir desse momento, o centro da cul­tura renascentista transferiu-se para Roma.

CinquecentoNeste período as obras artísticas renascentistas atingiram seu mais alto grau de elaboração. Na pintura destacam-se Leonardo da Vinci (1452-1519), Michelangelo (1475-1564;), Rafael (1483-1520) e Botticelli (1444-1510), que surgem como artistas representativos de todo o período renas­centista. Da Vinci também colaborou muito para o desenvolvimento das reali­zações científicas da época, uma vez que explorou áreas como engenharia hidráu­lica, arquitetura, matemática, óptica, as­tronomia e biologia, entre outros campos do conhecimento.

Na literatura, o principal escritor foi o romancista e poeta Ariosto (1474-1533), que continuou as tradições de Petrarca, Boccaccio e Dante, dando um tom mais humanístico às suas obras. Maquiavel também se inclui neste período. Após este "período de ouro" iniciou-se a decadência do Renascimento italiano.

O Renascimento atingiu quase todas as regiões da Europa, sempre muito influen­ciado pelo Renascimento italiano, mas com características próprias de cada país.

Países Baixos — As atividades comer­ciais e manufatureiras sempre estiveram presentes com muita força na região des­de o final da Idade Média. Isso foi um fato determinante para o desenvolvimen­to do Renascimento, de um mercado de artes e artistas e do mecenato. Foi na pintura que o Renascimento flamengo se manifestou mais claramen­te. Robert Campin (1375-1444), Bruegel e os irmãos Jan (1390-1441) e Hubert (1366-1426) Van Eyck, entre tantos ou­tros, foram os que mais se destacaram. Mas talvez venha da literatura seu inte­lectual mais conhecido, Erasmo de Rotterdam (1466-1536), em cuja obra principal (Elogio da loucura) criticou du­ramente a cultura medieval e a corrup­ção da Igreja Católica. França — O Renascimento francês foi menos vigoroso que o italiano e o flamen­go. Os monarcas Luís XI e Francisco I foram autênticos mecenas, financiando e protegendo artistas e intelectuais. As realizações mais notáveis estão no cam­po da literatura, com François Rabelais (1494-1553), criador dos personagens Gargântua e Pantagruel, em livros que renovaram a prosa e criticaram a Igreja e o universo medieval, e na filosofia, com Michel de Montaigne (1533-1592).

Inglaterra — Aqui o Renascimento ocorreu tardiamente, no final do século XV, coincidindo com a centralização do Estado inglês. A música, a literatura e o teatro tiveram um desenvolvimento sig­nificativo na Inglaterra renascentista. Surgiram neste período vários traduto­res das obras clássicas para o inglês. Um dos humanistas ingleses mais criativos foi Thomas Morus (1475-1535), autor de Utopia (1516), em que descreve as condições de vida de uma sociedade sem ricos e pobres, em uma ilha imagi­nária. Por problemas religiosos, ele foi preso e executado por ordem do rei Henrique VIII.

O pensador e filósofo Francis Bacon (1561-1626) começou a desenvolver o método indutivo e experimental e ainda serve de referência para a compreensão da ciência moderna.

Talvez seja no teatro que tenha surgido o mais notável homem de letras da Ingla­terra: William Shakespeare (1564-1618). Considerado um dos maiores dramatur­gos de todos os tempos, apesar de algu­mas de suas obras criticarem os valores do cavaleiro e do mundo medieval e a fal­ta de um rei poderoso, muitas vezes ele demonstrou aceitar a influência do ima­ginário popular da Idade Média, compos­to por bruxas, fantasmas, fadas e faunos.

Espanha e Portugal — O Renascimento na península Ibérica assumiu caracterís­ticas especiais, sendo às vezes influencia­do pelas artes mouras e pelo cristianismo.

Os renascentistas espanhóis mais im­portantes foram o pintor El Greco (1541-1614) e o escritor Miguel de Cervantes (1547-1616), autor de Dom Quixote de La Mancha. Em Portugal, o destaque foi o poeta Luís de Camões (1525-15 80), autor da famosa epo­péia sobre a conquista marítima portu­guesa: Os Lusíadas. Há também as obras do teatrólogo Gil Vicente (1470-1536), criador do teatro nacional português.

O Renascimento científico: o nascimento da ciência moderna

Foi também nesse mesmo quadro de profundas transformações que a ciência moderna lançou suas bases fundamentais. Abandonando as explicações sobrenaturais típicas da Idade Média, os renascentistas procuravam análises mais racionais, isto é, a razão humana, e não a revelação divina, deveria explicar a realidade.

Para chegar a uma explicação racional das coisas era necessário um método cien­tífico de observação, coleta de dados e cria­ção de hipóteses, que deveriam ser testadas por meio de experimentações. Como se vê, o racionalismo e o experimentalismo foram as bases do conhecimento científico no iní­cio dos tempos modernos e até hoje são referenciais importantes para a ciência.

O polonês Nicolau Copérnico (1473-1543) formulou a teoria heliocêntrica — a Terra e os outros astros giram em torno do Sol, que é o centro do universo — em opo­sição à geocêntrica — na qual a Terra era o centro do universo —, defendida pela Igreja Católica. Um contemporâneo de Copérnico foi Giordano Bruno, que levou suas teorias para a Itália, além de assumir posições panteístas (só existe o universo real, e Deus faz parte dele como uma síntese de tudo). Por assumir posições totalmente opostas às da Igreja Católica, foi condenado pela Inquisição e queimado vivo.

Johann Kepler (1571-1630) deu conti­nuidade às ideias de Copérnico e demonstrou que as órbitas dos planetas não eram circulares mas elípticas.

O italiano Galileu Galilei (1564-1642) é considerado o pai da física moderna. Ele defendia a idéia de que qualquer conheci­mento científico deveria seguir um méto­do e ser comprovado experimentalmente. Também foi muito perseguido pela Igreja e obrigado a rever suas posições.

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